quarta-feira, 27 de maio de 2015

Envelhecimento e treinamento de potência: aspectos neuromusculares e funcionais.




 

O envelhecimento pode causar prejuízos e comprometimentos dos sistemas cardiovascular e neuromuscular e das atividades funcionais e a prática de exercício físico pode atenuar esse quadro. A melhor aptidão física neuromuscular, por exemplo, o aumento da capacidade de gerar força e potência musculares, contribui para uma menor taxa de mortalidade bem como na melhora dos aspectos funcionais, ou seja, do rendimento dos idosos nas atividades diárias, laborais e recreativas. Para aumentar a força e potência musculares é preciso realizar de forma sistemática exercícios específicos, ou seja, o treinamento de diferentes manifestações da força, como por exemplo, da potência muscular que é aquele realizado em altas velocidades de execução. O treinamento da potência muscular pode ser uma estratégia no combate dos efeitos adversos do envelhecimento no sistema neuromuscular bem como na melhora da aptidão física relacionada à saúde e desempenho esportivo desde que realizado de forma segura, efetiva e especifica para os idosos.

    O que é o envelhecimento?

    Conjunto de processos inerentes a todos os seres vivos e que se expressa pela perda da capacidade de adaptação ao ambiente e pela diminuição da funcionalidade de diferentes sistemas biológicos. É preciso destacar que o processo de envelhecimento, promove redução das atividades funcionais (caminhar, subir escadas, levantar e sentar) e compromete a independência. Ou seja, será necessário mais tempo para realizar determinada tarefa e posteriormente haverá mudança no padrão motor de realização.
    A inatividade física e o sedentarismo contribuem no agravamento do processo de envelhecimento?
    Sim, pois geram um ciclo-vicioso, ou seja, inatividade física (desuso) gera falta de condicionamento físico que por sua vez gera mais fragilidade muscular; mais perda de autonomia e menor motivação e autoestima; e mais ansiedade e depressão... O que gera mais inatividade física (desuso)... E o ciclo se repete.
    A força muscular pode manifestar-se de diferentes formas. Em resumo, quais seriam elas?
    Força máxima: quantidade máxima de força que um músculo ou grupo muscular pode gerar em um padrão específico de movimento em determinada velocidade;
    Potência muscular: desenvolvimento de força em altas velocidades. É a taxa de realização de trabalho, ou a relação da força pela unidade de tempo;
    Resistência de força (força resistente): quando a força é realizada por períodos mais prolongados, de 15 a 50 repetições.
    Quais são as adaptações que o treinamento de força pode promover em idosos no que se refere à melhora da qualidade de vida?
    Aumento dos níveis de força em suas diferentes manifestações (potência máxima e resistência de força), aumento da massa muscular, melhora na densidade mineral óssea, melhora dos níveis de flexibilidade, diminuição do risco de queda, melhora da capacidade aeróbia e melhora nas atividades funcionais.
    Em linhas gerais, como se deve prescrever treinamento de força para idosos?
    A manipulação das diferentes variáveis é similar à de sujeitos jovens, ou seja, exercícios voltados aos maiores grupos musculares, duas a quatro séries por exercício, oito a 15 repetições/série, mínimo de duas sessões semanais a uma intensidade de 50 a 80% de uma repetição máxima (1RM).
    Porque idosos têm maior janela de adaptação biológica ao treinamento de força?
    Isso tem relação com questões biológicas relacionadas ao envelhecimento e ao estilo de vida sedentário (desuso). Ou seja, mesmo um menor volume (frequência semanal e número de séries) e intensidade (% de 1RM) podem proporcionar efeitos benéficos.
    Como se comporta o rendimento da força muscular durante o envelhecimento?
    Os níveis absolutos de força máxima e de potência são afetados pela idade e os idosos apresentam valores inferiores aos de jovens. O pico de força máxima ocorre na 3ª década de vida, decaindo progressivamente, com declínio acentuado a partir dos 50 anos (de 12 a 14% por década) e aumentado a partir dos 70 anos (30% por década). Maiores reduções têm sido observadas na potência muscular (≈40%). No entanto, pela dificuldade em se realizar estudos desse tipo, os valores são muitas vezes baseados em estudos transversais ou longitudinais com no máximo 5 a 10 anos de acompanhamento. Quanto ao gênero o declínio é maior em mulheres. Com relação aos grupos musculares observa-se maior declínio nos membros inferiores. Contudo, a capacidade de aumentar a força muscular não é determinada pelo fator idade, ou seja, a treinabilidade dos músculos é a mesma no decorrer de toda a vida.
    A diminuição da força e potência musculares com o avanço da idade é multifatorial. Alguns dos fatores têm relação com o estilo de vida e podem ser revertidos. Quais seriam os possíveis fatores responsáveis.
    -Redução da área de secção transversa muscular (sarcopenia), oriunda da atrofia muscular e a redução do número de fibras musculares (preferencialmente das fibras do tipo II);
    -Aumento de tecido não contrátil (% de gordura);
    -Redução da capacidade de recrutamento das unidades motoras pela redução da velocidade de contração e da frequência de disparo dos impulsos elétricos;
    -Diminuição da coordenação intermuscular resultante da coativação de grupos musculares antagonistas;
    -Diminuição da potência muscular atribuída à redução seletiva das unidades motoras do tipo II, o que reduz a capacidade de gerar força e velocidade;
    -Menor rigidez dos tendões, o que contribui na diminuição da potência muscular, pela dificuldade de transferência da força do músculo à estrutura óssea;
    -Alterações da atividade enzimática e endócrina (redução do hormônio de crescimento, testosterona e do fator de crescimento derivado da insulina e consequentemente redução da síntese proteica);
    -Diminuição dos níveis de atividade física com o avanço da idade. É importante observar que a manutenção das atividades habituais (caminhadas, trabalhos de jardinagem e andar de bicicleta), não garante a manutenção de níveis satisfatórios de força e potência musculares.
    São fatores que podem aumentar o risco e a incidência de quedas em idosos:
    A dificuldade no equilíbrio e controle motor, causada principalmente pela deterioração do sistema sensório-motor; a ocorrência prematura de fadiga muscular, causada pela maior necessidade relativa da força muscular; a incapacidade de gerar quantidade suficiente de força muscular; e a diminuição da potência muscular. É preciso destacar que ≈ 35% dos idosos sofrem algum tipo de queda/ano, aumentando este percentual com o avanço da idade, sendo que 50% destas quedas levam a algum tipo de lesão (5 a 6% de lesões graves e 5% de fraturas). Além disso, o histórico de quedas pode contribuir na redução da prática de atividade física.
    De forma geral, o que é interessante destacar na prescrição do treinamento de força?
    Quando os protocolos de treinamento de força comparam diferentes velocidades de contração, tanto tradicional (com tempo de contração para cada uma das fases, concêntrica e excêntrica, de 2 a 3 segundos) quanto de potência (com máxima velocidade na fase concêntrica), respostas similares são encontradas no ganho de força máxima. No entanto, maiores ganhos são obtidos nas avaliações funcionais (subir escadas, levantar de cadeiras e caminhar) e de potência (velocidade de contração) em favor do grupo de maior velocidade de contração.
    Particularmente, o que é interessante destacar na prescrição do treinamento de força para idosos?

    Identificar a carga e velocidade de contração que proporcionem as melhores adaptações neuromusculares ou funcionais é uma das questões mais relevantes na prescrição do treinamento de força para idosos. A principal diferença entre o treinamento de potência e o de força tradicional é a realização da fase concêntrica em máxima velocidade de contração (≈ 1s). Sabe-se que o treinamento de potência específico é mais efetivo no ganho de potência quando comparado ao treinamento de força tradicional. Apesar de poucos estudos terem avaliado as cargas mais efetivas na melhora da potência muscular foram observadas que aquelas entre 40 e 70% de 1RM são ideais para a produção de potência. Adicionalmente, o treinamento de potência é mais efetivo na melhora das habilidades e capacidades funcionais (independência e rendimento nas atividades da vida diária) que o treinamento tradicional de força. Quanto à melhora dos níveis da força máxima, ambos os tipos de treinamento apresentam a mesma efetividade.

    Referencial: Carlos Leandro Tiggemann, Caroline Pieta Dias, Matias Noll, Maira Cristina Wolf Schoenell, Luiz Fernando Martins Kruel. Envelhecimento e treinamento de potência: aspectos neuromusculares e funcionais. Rev. Educ. Fis/UEM, v. 24, n. 2, p. 295-304, 2. trim. 2013.


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