Envelhecimento e treinamento de potência: aspectos neuromusculares e funcionais.
O envelhecimento pode causar prejuízos e comprometimentos dos sistemas cardiovascular e neuromuscular e das atividades funcionais e a prática de exercício físico pode atenuar esse quadro. A melhor aptidão física neuromuscular, por exemplo, o aumento da capacidade de gerar força e potência musculares, contribui para uma menor taxa de mortalidade bem como na melhora dos aspectos funcionais, ou seja, do rendimento dos idosos nas atividades diárias, laborais e recreativas. Para aumentar a força e potência musculares é preciso realizar de forma sistemática exercícios específicos, ou seja, o treinamento de diferentes manifestações da força, como por exemplo, da potência muscular que é aquele realizado em altas velocidades de execução. O treinamento da potência muscular pode ser uma estratégia no combate dos efeitos adversos do envelhecimento no sistema neuromuscular bem como na melhora da aptidão física relacionada à saúde e desempenho esportivo desde que realizado de forma segura, efetiva e especifica para os idosos.
O que é o envelhecimento?
Conjunto
de processos inerentes a todos os seres vivos e que se expressa pela
perda da capacidade de adaptação ao ambiente e pela diminuição da
funcionalidade de diferentes sistemas biológicos. É preciso
destacar que o processo de envelhecimento, promove redução das
atividades funcionais (caminhar, subir escadas, levantar e sentar) e
compromete a independência. Ou seja, será necessário mais tempo
para realizar determinada tarefa e posteriormente haverá mudança no
padrão motor de realização.
A
inatividade física e o sedentarismo contribuem no agravamento do
processo de envelhecimento?
Sim, pois geram um
ciclo-vicioso, ou seja, inatividade física (desuso) gera falta de
condicionamento físico que por sua vez gera mais fragilidade
muscular; mais perda de autonomia e menor motivação e autoestima; e
mais ansiedade e depressão... O que gera mais inatividade física
(desuso)... E o ciclo se repete.
A
força muscular pode manifestar-se de diferentes formas. Em resumo,
quais seriam elas?
Força máxima:
quantidade máxima de força que um músculo ou grupo muscular pode
gerar em um padrão específico de movimento em determinada
velocidade;
Potência muscular:
desenvolvimento de força em altas velocidades. É a taxa de
realização de trabalho, ou a relação da força pela unidade de
tempo;
Resistência de força
(força resistente): quando a força é realizada por períodos
mais prolongados, de 15 a 50 repetições.
Quais
são as adaptações que o treinamento de força pode promover em
idosos no que se refere à melhora da qualidade de vida?
Aumento dos níveis de
força em suas diferentes manifestações (potência máxima e
resistência de força), aumento da massa muscular, melhora na
densidade mineral óssea, melhora dos níveis de flexibilidade,
diminuição do risco de queda, melhora da capacidade aeróbia e
melhora nas atividades funcionais.
Em
linhas gerais, como se deve prescrever treinamento de força para
idosos?
A manipulação das
diferentes variáveis é similar à de sujeitos jovens, ou seja,
exercícios voltados aos maiores grupos musculares, duas a quatro
séries por exercício, oito a 15 repetições/série, mínimo de
duas sessões semanais a uma intensidade de 50 a 80% de uma repetição
máxima (1RM).
Porque
idosos têm maior janela de adaptação biológica ao treinamento de
força?
Isso tem relação com
questões biológicas relacionadas ao envelhecimento e ao estilo de
vida sedentário (desuso). Ou seja, mesmo um menor volume (frequência
semanal e número de séries) e intensidade (% de 1RM) podem
proporcionar efeitos benéficos.
Como
se comporta o rendimento da força muscular durante o
envelhecimento?
Os níveis absolutos de
força máxima e de potência são afetados pela idade e os idosos
apresentam valores inferiores aos de jovens. O pico de força máxima
ocorre na 3ª década de vida, decaindo progressivamente, com
declínio acentuado a partir dos 50 anos (de 12 a 14% por década) e
aumentado a partir dos 70 anos (30% por década). Maiores reduções
têm sido observadas na potência muscular (≈40%). No entanto, pela
dificuldade em se realizar estudos desse tipo, os valores são muitas
vezes baseados em estudos transversais ou longitudinais com no máximo
5 a 10 anos de acompanhamento. Quanto ao gênero o declínio é maior
em mulheres. Com relação aos grupos musculares observa-se maior
declínio nos membros inferiores. Contudo, a capacidade de aumentar a
força muscular não é determinada pelo fator idade, ou seja, a
treinabilidade dos músculos é a mesma no decorrer de toda a vida.
A
diminuição da força e potência musculares com o avanço da idade
é multifatorial. Alguns dos fatores têm relação com o estilo de
vida e podem ser revertidos. Quais seriam os possíveis fatores
responsáveis.
-Redução da área de
secção transversa muscular (sarcopenia), oriunda da atrofia
muscular e a redução do número de fibras musculares
(preferencialmente das fibras do tipo II);
-Aumento de tecido não
contrátil (% de gordura);
-Redução da capacidade
de recrutamento das unidades motoras pela redução da velocidade de
contração e da frequência de disparo dos impulsos elétricos;
-Diminuição da
coordenação intermuscular resultante da coativação de grupos
musculares antagonistas;
-Diminuição da
potência muscular atribuída à redução seletiva das unidades
motoras do tipo II, o que reduz a capacidade de gerar força e
velocidade;
-Menor rigidez dos
tendões, o que contribui na diminuição da potência muscular, pela
dificuldade de transferência da força do músculo à estrutura
óssea;
-Alterações da
atividade enzimática e endócrina (redução do hormônio de
crescimento, testosterona e do fator de crescimento derivado da
insulina e consequentemente redução da síntese proteica);
-Diminuição dos níveis
de atividade física com o avanço da idade. É importante observar
que a manutenção das atividades habituais (caminhadas, trabalhos de
jardinagem e andar de bicicleta), não garante a manutenção de
níveis satisfatórios de força e potência musculares.
São
fatores que podem aumentar o risco e a incidência de quedas em
idosos:
A dificuldade no
equilíbrio e controle motor, causada principalmente pela
deterioração do sistema sensório-motor; a ocorrência prematura de
fadiga muscular, causada pela maior necessidade relativa da força
muscular; a incapacidade de gerar quantidade suficiente de força
muscular; e a diminuição da potência muscular. É preciso destacar
que ≈ 35% dos idosos sofrem algum tipo de queda/ano, aumentando
este percentual com o avanço da idade, sendo que 50% destas quedas
levam a algum tipo de lesão (5 a 6% de lesões graves e 5% de
fraturas). Além disso, o histórico de quedas pode contribuir na
redução da prática de atividade física.
De forma geral, o que
é interessante destacar na prescrição do treinamento de força?
Quando os protocolos de
treinamento de força comparam diferentes velocidades de contração,
tanto tradicional (com tempo de contração para cada uma das fases,
concêntrica e excêntrica, de 2 a 3 segundos) quanto de potência
(com máxima velocidade na fase concêntrica), respostas similares
são encontradas no ganho de força máxima. No entanto, maiores
ganhos são obtidos nas avaliações funcionais (subir escadas,
levantar de cadeiras e caminhar) e de potência (velocidade de
contração) em favor do grupo de maior velocidade de contração.
Particularmente,
o que é interessante destacar na prescrição do treinamento de
força para idosos?
Identificar a carga e
velocidade de contração que proporcionem as melhores adaptações
neuromusculares ou funcionais é uma das questões mais relevantes na
prescrição do treinamento de força para idosos. A principal
diferença entre o treinamento de potência e o de força tradicional
é a realização da fase concêntrica em máxima velocidade de
contração (≈ 1s). Sabe-se que o treinamento de potência
específico é mais efetivo no ganho de potência quando comparado ao
treinamento de força tradicional. Apesar de poucos estudos terem
avaliado as cargas mais efetivas na melhora da potência muscular
foram observadas que aquelas entre 40 e 70% de 1RM são ideais para a
produção de potência. Adicionalmente, o treinamento de potência é
mais efetivo na melhora das habilidades e capacidades funcionais
(independência e rendimento nas atividades da vida diária) que o
treinamento tradicional de força. Quanto à melhora dos níveis da
força máxima, ambos os tipos de treinamento apresentam a mesma
efetividade.
Referencial: Carlos
Leandro Tiggemann, Caroline Pieta Dias, Matias Noll, Maira Cristina
Wolf Schoenell, Luiz Fernando Martins Kruel. Envelhecimento
e treinamento de potência: aspectos neuromusculares e funcionais.
Rev. Educ. Fis/UEM, v. 24, n. 2, p. 295-304, 2. trim. 2013.
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